19 de dezembro de 2011

O Cândido de Voltaire, o Mundo e o Autor de Eclesiastes

Acabei de ler o livro "Cândido ou o Otimismo", de Voltaire. É um romance muito interessante, onde o filósofo narra as desventuras de Cândido, um rapaz que aprendeu desde criança que este é o melhor dos mundos possíveis, que tudo o que acontece sempre é bom, que tudo leva ao bem e todos estão maravilhosamente. Esta é a filosofia positivista de Leibniz, a qual Voltaire combate ao longo de todo o livro. Cândido passa por muitas desventuras, encontra seu antigo professor, o otimista Pangloss, perde sua amada, a encontra e a perde de novo, viaja para América, encontra o pais de Eldorado, único lugar da terra onde todos são efetivamente iguais e felizes, um paraíso perdido, no qual, contudo, Cândido e seu servo Cacambo não ficam por muito tempo, um querendo encontrar sua amada e o outro desejando voltar à sua terra, a Europa. Eles partem cheios de riquezas, que contudo perdem depois de muito caminho, Cândido é roubado por um holandês, por muitos franceses e por mercadores. Depois encontra um filósofo para o qual tudo no mundo é ruim, chamado Martinho. Ele é o oposto de Pangloss, que tinha sido enforcado mas que depois Cândido vai achar de escravo numa galera, remando. Depois de idas e vindas, Cândido reencontra sua amada, agora muito feia, e casa com ela por teimosia, perde o resto da sua fortuna e termina com uma granja em Constantinopla, vivendo com uma mulher amargurada, um servo que reclama da existência e um Pangloss que não admite que este não é o melhor dos mundos. Ele, Cândido, Martinho e Cacambo discutem esse assunto ao longo do livro, ora afirmando, ora confrontando essa afirmação ao que encontram no caminho: pessoas que sofrem, miseráveis, tristes, países em guerra, injustiças e opressão. No fim, Cândido, depois de conhecer um homem que simplesmente é feliz com o que tem, em lugar de procurar uma felicidade idealista, conclui que o que ele tem a fazer é "cultivar o seu jardim". Assim, ele chega a um equilíbrio entre o otimismo de Pangloss e o pessimismo de Martinho. O mundo não é nem o melhor dos mundos possível, nem a pior das porcarias. O mundo é algo a ser aproveitado. Tem suas coisas boas, e tem suas coisas ruins, e o melhor a fazer é desfrutar o que se tem, e ser produtivos, já que o homem não nasceu para o ócio. 
Este livro, mesmo sendo escrito há muito tempo, ainda é muito atual. Hoje em dia, mesmo que todos saibam que há tristezas no mundo, que há muitas injustiças, que há opressão, desigualdade, racismo, preconceito, escravidão, violência, as pessoas muitas vezes pretendem fingir que não há nada disso. O mundo consumista de hoje faz as pessoas cegas, preocupadas com seus próprios umbigos, interessadas unicamente em adquirir mais e mais coisas para seu próprio prazer, buscando a sua felicidade sem se importar com os outros. Cândido, na sua caminhada pelo mundo, se surpreende com todas as desgraças que acontecem aos homens, e, querendo encontrar alguém feliz com sua condição, não o encontra, nem mesmo quando esse alguém é rico, pois é tão rico que fica aborrecido com sua própria riqueza, e não acha mais prazer em nada. Hoje há muitas pessoas assim, que têm tudo e não têm nada, que, mesmo sendo ricos, não são felizes.
Não posso deixar de ligar o pensamento de Voltaire ao do autor do Eclesiastes. Tanto um como outro refutam um pensamento: Voltaire, aquele de que o mundo em que vivemos é o melhor possível, o autor de Eclesiastes, o pensamento, ou melhor, a teologia que diz que o justo se da bem e o mau se da mal. Eles não tem que fazer outra coisa que dar uma olhada ao seu redor: onde quer que eles vêem, há dor, tristeza, injustiça. E o pior é que poucas coisas mudaram desde os tempos bíblicos, e desde os tempos de Voltaire. Ainda há injustiça, maldade, opressão, desigualdade. O que acho mais interessante é que os dois autores chegam a uma conclusão semelhante: ante todas as tristezas do mundo, o que há de melhor a fazer é aproveitar o dia-a-dia. Cultivar o jardim, aproveitar o tempo, desfrutar das coisas do mundo: o pão, o vinho, a mulher ou o homem com quem se está. Não adianta querer inventar um mundo perfeito, pois o mundo não o é. 
No final do livro, Pangloss ainda teima que este é o melhor dos mundos e que todas as desgraças sofridas por Cândido foram boas. Ao que este responde: "Muito bem, mas é preciso cultivar nosso jardim". É uma frase que resume todo o pensamento de Voltaire, e que se coneta com o "bebe teu vinho, come teu pão e desfruta a vida com a mulher da tua juventude, pois esta é a tua parte na terra" (versículo parafraseado) de Eclesiastes. E que, ao meu ver, é o melhor que podemos fazer neste nosso mundo maluco. Não podemos nos enfiar numa cápsula de cristal e pretender ignorar as tristezas deste mundo. Mas também não podemos achar que não há nada neste mundo que valga a pena (como muitos cristãos fazem). Temos é que viver a nossa vida, dia após dia, com simplicidade, sem deixar-nos levar pelo consumismo do nosso tempo, fazendo bem o que podemos fazer.

18 de dezembro de 2011

Facebook e a Feira da Banalidade

E por fim o Facebook virou moda no Brasil. Depois de muito tempo ignorado, o Facebook conseguiu desbancar o Orkut. Agora todo mundo usa Facebook, e fala mal do Orkut. Algo que chama minha atenção em tudo isso é a Feira da Banalidade que o site de relacionamentos virou de um tempo pra cá. São piadas sem graça, frases sem noção, machistas ou apelativas de alguma forma, desenhos mal feitos, coisas que não dá pra entender como foram parar ai. E todo mundo curte, todo mundo compartilha. Parece que a impessoalidade da internet nos permite exibir um pouco da nossa banalidade, e usamos sites como o Facebook para compartilhar a parte de nós que é mais brincalhona, mais sem noção. 
Mesmo que haja pessoas postando coisas "sérias", a maioria das coisas que se vê no Face é pura "palhaçada". Sites como esse tiram nossa inibição, parece que podemos falar tudo que pensamos, zoar os outros sem piedade, compartilhar um pouco da nossa tolice. 
O problema é quando a tolice é real, quando pessoas sem noção compartilham seus pensamentos sem te-los pensado, e acontecem coisas como a brincadeira de mau gosto com o Lula, as frases chatas quando a Amy Winehouse morreu. Mesmo sendo o Facebook um site que muitos usam para relaxar, para passar o rato, devemos ser conscientes do que escrevemos nele, do que postamos. Afinal, mesmo que cada um escreva e poste na privacidade do seu lar, no seu quarto ou escritório, o que se coloca na internet vira algo público! 
Ahhh, ser humano... pretendemos ser tão sábios, tão sérios, quando no fundo todos temos algo de tolice!